A acção de impugnação de actos administrativos
Em primeiro lugar cabe fazer uma caracterização histórica do acto administrativo.
No período liberal exista uma noção autoritária do acto administrativo na medida em que era visto como uma manifestação autoritária do poder estadual relativamente aos particulares. Isto é sintomático da visão substantiva que existia neste período das relações entre a administração e o cidadão, que consistia na percepção da administração como uma realidade potencialmente agressiva dos direitos do particular. O acto administrativo começou por servir para delimitar as acções da administração pública excluídas por lei da fiscalização dos tribunais judiciais, mas mais tarde é utilizado precisamente para «definir as actuações da administração pública que estão sujeitas ao controlo dos tribunais administrativos ». Ainda hoje é essa a sua função principal para fins de garantia dos particulares.
No período do Estado Social os poderes públicos passam a desempenhar um novo papel na vida da sociedade que dá origem ao crescimentos das funções estaduais, quantitativa e qualitativamente, tanto em relação às funções tradicionais (como de polícia com o acréscimo das tarefas de fiscalização e controlo administrativo, nomeadamente em matéria económica) tanto como em relação ao surgimento de novas tarefas públicas nos domínios económicos e sociais (urbanismo,ambiente,cultura,ordenamento do território e consumo). Estas tarefas públicas cabem todas à administração pública fazendo com que a mesma e os seus actos deixem de ser concebidos apenas como agressivos ou lesivos dos direitos dos particulares (como no período liberal) para passarem a ser concebidos como actos positivos/de prestação e a administração como prestadora de bens e serviços.
A acção de impugnação de actos admistrativos é uma subespécie/ "subacção" da acção administrativa na teoria,mas na realidade é uma verdadeira e própria acção. O recurso de anulação é o precedente histórico da acção de impugnação, visto que não era propriamente um recurso, era antes uma "acção chamada recurso". E era uma acção porque se tratava da primeira apreciação jurisdicional de um litígio emergente de uma relação jurídica administrativa na sequência da prática de uma acto pela administração, não se tratando então de uma apreciação jurisdicional de 2ª instância versando sobre uma decisão judicial.Para além disto, o recurso de anulação não era apenas de anulação, isto é, as sentenças ditas de anulação podiam possuir para além do efeito demolitório da anulação outros efeitos de natureza conformativa e represtinatória.
A reforma do contecioso administrativo optou por pôr termo ao recurso de anulção e subtituí-lo pela acção de impugnação de actos administrativos. Esta substituição resulta claramente do mecanismo da cumulação dos pedidos. O CPTA contém um claúsula geral de admissibilidade de cumulação de pedidos materialmente conexos(arts.4ª ,nº1), a qual é acompanhada de uma enumeração exemplificativa de pedidos cumuláveis com o de anulação do acto administrativo(art.4º,nº2).
A cumulação de pedidos pode verificar-se logo no momento da propositura da acção como em momento posterior, pode verificar-se em identidade de nível como relação de alternatividade ou subsidiariedade e pode dizer respeito a pedidos de vários sujeitos processuais que podem dar origem a situações de litisconsórcio e de coligação de partes, que tanto pode ser real como aparente.
A cumulção é real ou aparente consoante os pedidos correspondem a diferentes utilidades económicas ou à mesma utilidade económica respectivamente. O CPTA atribui uma grande relevância a esta última modalidade (cumulação aparente) ao considerar que « a cumulação de pedidos é admissível quando entre os pedidos se verifique uma relação de prejudicialidade», ou seja, quando respeitem «à mesma utilidade económica».(Art.4º, nº1, al.a)
A passagem do recurso de anulação para a acção de impugnação causou uma mudança de paradigma processual, isto é, passou-se do contencioso de "mera anulação" para o de "plena jurisdição". Na opinião do professor Vasco Pereira da Silva isto gera uma situação paradoxal na medida em que, apesar de o legislador estabelecer que a partir de agora todos os pedidos são admissíveis e que o objecto de apreciação jurisdicional se deve ampliar do "processo ao acto" para o juízo sobre a relação administrativa, por outro lado qualifica tudo o que vá além da "simples anulacão" como "verdadeira e própria" cumulação de pedidos o que significa que toma como medida desta transformação o anterior recurso de anulação.
Com a reforma do contencioso administrativo todos os pedidos necessários à tutela dos direitos das relações administrativas são admissíveis no processo declarativo, portanto mesmo na "(sub)acção" de impugnação de actos administrativos, é sempre possível a cumulação aparente do pedido de anulação do acto administrativo com o pedido de condenação e restabelecimento da situação anterior.
Hoje em dia a acção de impugnação de actos administrativos permite a apreciação judicial de toda a relação jurídica controvertida mediante a admissibilidade de todos os pedidos necessários à tutela dos direitos dos particulares.
Bibliografia:
- "O Contecioso Administrativo no Divã da Psicanálise", 2ª Edição, Almedina. Vasco Pereira da Silva .
- Aulas de contencioso Administrativo do professor Vasco Pereira da Silva, 1º semestre do ano lectivo 2018/2019.
Violeta de Azevedo Coutinho e Castro, nº140114101
Sem comentários:
Enviar um comentário