segunda-feira, 22 de outubro de 2018

Quem é PARTE no processo administrativo?



Quem é PARTE no processo administrativo?

         O Particular e
         a Administração.
      É a Resposta correta?
       Tudo parece indicar que sim.
 Mas, nEm sempre foi assim:

“Não há partes no processo administrativo.”
Esta foi a resposta durante muitos anos dada pelo legislador e pela doutrina clássica.
De acordo com o modelo francês, o contencioso administrativo seguia um modelo objetivo, sendo o processo apenas destinado à verificação da legalidade da atuação administrativa. 
No plano substantivo, apresentam-se essencialmente duas correntes acerca da relação jurídico-administrativa. Segundo a doutrina positivista, defendida por Kelsen e Merkl, não era concebida uma relação jurídica entre Administração e particular, sendo este último um “mero objeto do poder soberano”. Por outro lado, G.Jellinek, Marcelo Caetano, entre outros, não rejeitam a figura da relação jurídica administrativa, mas consideram-na como uma “relação geral de poder”.
Assim,” (...) o ato administrativo constituía o conceito central da dogmática, enquanto a relação jurídica ocupava a posição claramente subalterna, sendo a sua utilização mais usada como forma de facilitar a comunicação entre administrativistas e privatistas, do que como um verdadeiro instituto jurídico-público”, como refere o Professor Vasco Pereira da Silva. Todo o processo girava em torno do ato administrativo, que era “tudo e todas as partes”.
Desta forma, por um lado, a Administração Pública não era considerada como parte, ocupando a mesma posição que o juiz, na medida em que ambos prosseguem a realização do interesse público. Neste sentido, o Professor Marcelo Caetano falava no “interesse da Administração Pública, que é o mesmo que o do tribunal”. Conclui-se, portanto, que a Administração não estava em juízo, não estava a ser julgada, o que significa que o tribunal não lhe poderia dar ordens, apenas podendo anular o devido ato.
Relativamente ao particular, não sendo admitida a existência de relações jurídico-administrativas, consequentemente não lhe eram reconhecidos direitos subjetivos públicos. “Isto porque é o reconhecimento de direitos subjetivos que faz com que o indivíduo deixe de ser tratado como objeto do poder, passe de “súbdito” a “cidadão”, se transforme num sujeito de direitos em condições de estabelecer relações jurídicas com os órgãos do poder público,”. Assim, ao particular era negado o estatuto de parte, que recorria ao tribunal, também, no sentido de auxiliar o juiz na prossecução do interesse público. No tribunal, não eram discutidos os seus direitos, nem o sujeito era o destinatário da sentença, sendo apenas a legalidade da atuação administração o alvo de atenção do juiz. Portanto, o particular apenas poderia beneficiar indiretamente da decisão do Tribunal, se esta fosse no sentido de anulação da atuação administrativa em análise.
Concluindo, não havendo direitos, para que o particular pudesse impugnar o ato, tinha de ter legitimidade que, segundo um primeiro critério, era definida como a titularidade de um interesse fáctico. Numa segunda etapa, este critério de legitimidade foi afastado, passando o interesse a ser caracterizado como direito, pessoal e legítimo. Assim, não sendo titular de direitos, é a legitimidade que justifica e permite que o particular possa recorrer ao tribunal.

“A Administração Pública e o particular são partes iguais no processo administrativo”
Esta é a resposta dada pelo nosso legislador, nos termos do artigo 6º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, instituída pela reforma de 2004. O legislador consagra, não só um processo de partes, como um processo de partes iguais, que defendem as suas posições substantivas, estando integradas numa relação jurídica, podendo tutelar os seus direitos dela emergentes.
Até se alcançar esta solução foi percorrido um longo caminho. Em 1976, o legislador constitucional introduziu, como consequência do princípio universal da dignidade da pessoa humana (1º CRP), o acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva (20º), bem como instituiu direitos fundamentais dos administrados (268º/4 e 5 CRP). Não obstante, não se pode defender que foi imediata a introdução de um sistema subjetivo de igualdade de partes no processo administrativo português.  Mesmo com a reforma de 1984-85, a Administração Pública, ainda que equiparada ao particular no que toca a uma intervenção em termos iguais no processo, é designada de “autoridade recorrida” (26º da LEPTA), não lhe cabendo o ónus de impugnação do alegado pelo particular.
Hoje, com a consagração do artigo 6º, o legislador estabelece um princípio de igualdade entre as partes, tanto ao nível de intervenção no processo, bem como de comportamento processual, na medida em que pode o tribunal condenar qualquer uma das partes por litigância de má fé, bem como pode responsabilizá-las pelos resultados do processo, mediante pagamento de custas processuais.
Esta igualdade prevista no artigo 6º tem de ser completada com uma leitura do artigo 8º. Assim, reconhecem-se às partes deveres de comportamentos recíprocos, sob pena de, tal como referi, o tribunal condenar por “litigância de má fé”. Desta forma, ao contrário do anteriormente defendido, nomeadamente pelo Professor Marcelo Caetano, recai sobre a Administração Pública o ónus de impugnação daquilo que foi alegado pelo particular. Se a Administração não contestar, corre o risco de o juiz dar como provados os factos alegados.
Concluindo, reconhecendo-se a existência de direitos do particular face à Administração e, portanto, a existência de relações jurídico-administrativas, a legitimidade deixa de se definir como um interesse direto, pessoal e legítimo, mas como pressuposto processual que permite aos titulares da relação controvertida estar em juízo quando estejam em causa dos seus direitos (9º e 10º) .

BIBIOGRAFIA:
Em busca do ato administrativo perdido, Professor Vasco Pereira da Silva
O contencioso administrativo no Divã da Psicanálise, Professor Vasco Pereira da Silva

Sofia Pinheiro
140115063

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