sábado, 10 de novembro de 2018

Em análise no divã da psicanálise: As relações multilaterais no Contencioso Administrativo


No Estado Pós-Social, a Administração Pública é essencialmente infraestrutural, ou seja, a Administração procura colaborar com os particulares no exercício da função administrativa, e as relações jurídicas que desenvolve transformaram-se em relações multilaterais, com uma multiplicidade de sujeitos
Nas relações multilaterais, todos os afetados por uma decisão administrativa são sujeitos da relação jurídica administrativa, o que obriga à abertura do processo a vários sujeitos e à procura de novas soluções processuais.
De acordo com o Professor Vasco Pereira da Silva, o legislador português consagrou no Código de Processo nos Tribunais Administrativos alguns mecanismos que têm em conta a existência de relações jurídicas com vários sujeitos e que permitem a sua participação no processo. No entanto, ao contrário do que acontece no Processo Civil, o legislador não consagrou no Contencioso Administrativo as situações de litisconsórcio, isto é, os casos em que existe uma necessidade de chamar à demanda todos os sujeitos da relação jurídica controvertida, sob pena de o litígio não poder ser conhecido, nos casos em que essa demanda seja necessária.
O legislador, no art. 12º do CPTA, permite a coligação de autores contra um ou vários demandados e ainda que um só autor proponha uma ação conjuntamente contra vários demandados, quando estejam verificadas as condições previstas.
Outra forma encontrada pelo legislador para introduzir a multiplicidade de sujeitos no processo foi a apensação de processos, prevista no art. 28º do CPTA. Neste caso, quando sejam propostas várias ações por autores separados, mas se verifiquem os pressupostos de admissibilidade da coligação e da cumulação de pedidos, deve ser ordenada a apensação dos processos, permitindo o julgamento conjunto dessas ações.
No art. 48º do CPTA, prevê-se a seleção de processos com andamento prioritário. Havendo um conjunto muito grandes processos, ou seja, mais do que 10 processos intentados no mesmo tribunal, que correspondem à mesma relação jurídica material ou a relações jurídicas materiais diferentes que coexistam em paralelo, o presidente desse tribunal deve determinar que seja dado andamento apenas a um desses processos e se suspenda a tramitação dos demais. Um dos processos tem assim um andamento prioritário, podendo os sujeitos dos restantes processos aderir depois à decisão dessa ação e gozar dos seus efeitos, havendo uma decisão favorável ao particular. Esta possibilidade depende da vontade das partes e tem como objetivo a simplificação das regras de processo, por razões de economia processual, uma vez que estas ações são suscetíveis de serem decididas com base na aplicação das mesmas regras a situações de facto do mesmo tipo.
O legislador do CPTA teve ainda em conta a necessidade de soluções adequadas a procedimentos com um número muito elevado de sujeitos, como são os casos dos concursos de pessoal, dos procedimentos realização de provas ou dos procedimentos de recrutamento. Estes procedimentos são os chamados procedimentos de massa e estão previstos no artigo 99º do CPTA. Tratam-se ações respeitantes à prática ou omissão de atos administrativos no âmbito de procedimentos com mais de 50 participantes, que justificam, do ponto de vista do processo, a tomada de decisões rápidas, sem descurar a tutela dos direitos dos particulares. Os interessados devem propor as ações no tribunal da sede da entidade demandada, sendo que quando se verificarem os pressupostos da coligação e da cumulação de pedidos, os processos são objeto de apensação obrigatória àquele que tiver sido intentado em primeiro lugar, seguindo depois a tramitação urgente.
Por fim, no âmbito das relações multilaterais, o legislador consagrou ainda uma outra forma de chamar ao processo outros sujeitos, os contrainteressados, a quem o provimento do processo impugnatório possa diretamente prejudicar ou que tenham um legítimo interesse na manutenção do ato impugnado. Admite-se desta forma a existência de outros sujeitos do lado da Administração Pública. No entanto, o Professor Vasco Pereira da Silva considera que esta possibilidade não devia ser tratada apenas com referência à ação de impugnação, mas que se devia considerar este tratamento como genérico e aplicável a todas as modalidades de ação.
Conclui-se que o legislador do CPTA integrou no Contencioso Administrativo alguns mecanismos que permitem a participação de vários sujeitos no mesmo processo. No entanto, tendo em conta as críticas apresentadas, o legislador ainda não conseguiu ter em conta todas as situações que advêm das relações jurídicas multilaterais.

Bibliografia:
Aulas teórico-práticas
PEREIRA DA SILVA, Vasco; O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise - Ensaio sobre as Ações no Novo Processo Administrativo; Edições Almedina, 2.ª Edição de 2009

Beatriz Lopes da Silva
Nº 140114025

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