domingo, 11 de novembro de 2018

Impugnabilidade dos atos administrativos, um pressuposto Definitivamente Oblíquo




Contextualizando de forma breve, quando falamos em impugnabilidade dos atos, referimo-nos ao modo como o ato administrativo entra no processo. 
Esta impugnabilidade é derivada da apreciação da integralidade da relação jurídica administrativa, sendo que, contrariamente ao que se passava, deixou de se considerar como único pedido admissível o de anulação do ato administrativo alargando as alternativas que o particular tem para de se defender de atuações da atuação administrativa.
Ora, parece-nos pertinente olhar para a evolução do conceito de ato administrativo para averiguar o pressuposto processual da impugnabilidade: 
No séc. XIX admitia-se que os atos agressivos da Administração Pública tivessem uma classificação conducente à definitividade e executoriedade. 
Mais tarde, no séc. XX estas duas características deixam de ser utilizadas porque a justiça é que diz o direito resolvendo o litígio, e a administração limita-se a usar o direito como um meio pelo que os atos não são, de forma alguma, noção de direito.
Assim, a partir dos anos 60, a administração reconduz-nos a um novo conceito de ato administrativo, que permite abranger os atos da administração agressiva e também os atos da administração prestadora e infra-estrutural. Este conceito substantivo traduz-se numa noção ampla de ato administrativo, que é agora suscetível de impugnação. Há uma lógica constitucional da subjetivização do contencioso e, por isso, desde já se entenda que não faz sentido definir a impugnabilidade tendo em conta características do passado visto que esta nova realidade claramente afasta a noção de ato definitivo e executório.
Ainda, parece-nos fundamental deixar claro que a noção de impugnabilidade do ato administrativo enquanto pressuposto processual não é uma noção substantiva. É uma situação jurídica em que o particular se encontra e que resulta da lesão e, portanto, o ato administrativo nestas condições pode ser impugnado. O que está aqui em causa é uma circunstância.

Falava-se anteriormente numa definitividade:
Horizontal: Neste sentido, era o ato que determinava o termo do procedimento e só esse ato era impugnável. Tudo o que acontecesse até aí não era impugnável porque só a propósito da ultima palavra da Administração Pública é que era apreciado todo o comportamento. 
Vertical: O ato era a ultima palavra da Administração Pública, e, por isso, era praticado pelo órgão de topo da hierarquia. O ato que era levado a juízo era o ato do Governo e depois recorria-se para o Conselho do Estado, que vinha do contencioso francês e da ideia da “decisão prévia”. 
Material:Era a que correspondia à lógica da definição material do direito. O ato tinha um significado material, que era um outro elemento que introduzia esta dimensão.

Esta ideia definitividade acima descrita não nos parece razoável. E porquê? 

Ora vejamos;

Quanto à Definitividade Horizontal:
Sabemos que a ideia era a de que o ato definia o direito, e, no art.51º não há nenhuma referência à logica da definição do direito. O procedimento é uma realidade complexa e no mesmo são praticados atos administrativos, e estes quando são lesivos dos direitos dos particulares devem permitir uma hipótese de o particular os impugnar quer sejam atos intermédios ou finais. 
Em 2015 a regra não se alterou, mas, surgem restrições:
Nº2 do art.51º: são exemplos;
Mas, o que vem no nº3 não é um exemplo: introdução de restrição que não existia em 2004. Estabelece-se o prazo para impugnação dos atos, que é o termo do procedimento. Ora, a decisão do momento da impugnação é da parte. Há aqui uma opção do advogado e do particular. Se quer impugnar a decisão final, impugna a mesma. Se quer qualquer outra decisão, deve fazê-lo. Limitou-se esta regra através do prazo. Apesar de tudo, não existe qualquer inconstitucionalidade, sendo esta formulação aceitável. 


No âmbito da Definitividade Vertical:
Em 2015 o legislador previu em termos limitados que continuasse a existir o mecanismo de recurso hierárquico necessário ou de reclamação necessária. E isto para permitir ao particular usar do pressuposto processual do ato administrativo.
O legislador estava a consagrar uma realidade que era inconstitucional. 
Mas, depois da reforma do procedimento veio a reforma do processo. E se a necessidade se destinava a ser um pressuposto processual era preciso que no código do processo esse pressuposto fosse previsto. 
E agora, como em nenhuma norma do código do processo se fala na necessidade de um prévio recurso, o legislador afastou a regra da necessidade que estava no CPA, pelo que o critério da executoriedade foi claramente revogado. 
Aproveitamos para deixar presente a ideia de que a definitividade vertical faz também pouco sentido, porque por um lado a Administração Pública e o juiz são entidades diferentes, e por outro lado não faz sentido que só possa ir a tribunal quem apresenta um recurso hierárquico. O recurso hierárquico tem a ver com a atuação da Administração Pública e a intervenção do juiz é algo diferente, pelo que, uma possível exigência de recurso hierárquico necessário, era, nem que fosse só por isto, manifestamente inconstitucional.   


Atentando por fim à Definitividade Material:
Esta ideia é afastada através da norma do art.53º do CPTA onde se admite a impugnação de atos confirmativos e de execução. A decisão executória não é reguladora; limita-se a reproduzir os resultados do ato anterior; a definição foi feita pela decisão anterior. Assim, O modo como está escrito este artigo permite-nos dizer que:
Em primeiro lugar, podem-se impugnar os atos de execução;
E depois, os atos declarativos, se tiverem um conteúdo novo, são diretamente impugnáveis.
Mas, também aqui em 2015 o legislador utiliza formas menos claras das que estavam em 2004... apesar de tudo, a regra mantém-se.
No art.54º mantém-se a essência: É mais fechada do que a de 2004 mas continua ser aberta, porque continua-se a admitir a impugnabilidade de atos administrativos ineficazes. Se é possível admitir que mesmo em relação a atos ineficazes, é possível admitir a impugnação, a eficácia não será critério de impugnação.


Concluindo, os pressupostos da definitividade não faziam sentido e é possível considerar atos que não são horizontalmente, verticalmente e materialmente definitivos sejam objeto do contencioso administrativo. 
O código mudou radicalmente e o que era a lógica tradicional do Contencioso Administrativo em Portugal deixou de ser. Agora, afasta-se de forma expressa a ideia da definitividade e executoriedade, que eram as características que antes estavam consagradas.
Portanto, se acompanharmos os diferentes argumentos enunciados, veremos que há uma intenção do legislador de afastar de forma categórica esses aspetos do passado, pelo que parece-nos que a única definitividade de que se pode falar é a obliqua, que não existe. 




Isabel Rebello de Andrade
140115097 

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