No seguimento de
muitos processos serem deixados sem resposta no final dos anos 90, o contencioso administrativo em 2002 foi alvo de
reformas muito significativas, nomeadamente no domínio do regime da cumulação
de pedidos, revelando uma aproximação à legislação processual civil e
representando um passo muito importante para assegurar uma tutela jurisdicional
efectiva.
A cumulação de pedidos no procedimento
administrativo tem como vantagens a celeridade e economia processuais,
facilitando assim o cumprimento do objetivo do autor. Este princípio encontra a
sua consagração legal no disposto no art. 4º do CPTA.
Perante a consagração deste
princípio, a cumulação de pedidos é uma inovação que permite ao particular, em vez
de propor separadamente várias ações, poder combinar o conteúdo dessas mesmas
numa só. Portanto, a primeira nota a ter em consideração é que a figura da
cumulação de pedidos é sempre uma faculdade do particular. O particular pode ou
não cumular, consoante seja sua vontade, segundo o art.º 4/1Regulado CPTA.
Quando pode haver cumulação de
pedidos? Para se poder verificar a figura da cumulação de pedido, é necessário que
se verifiquem 3 pressupostos: a compatibilidade substantiva, a conexão de
pedidos e por fim a compatibilidade processual
Em primeiro lugar é imperativo
uma compatibilidade substantiva entre os pedidos que se traduz na circunstância
de os efeitos dos pedidos cumulados terem de ser substancialmente compatíveis
entre si quando o autor pretenda a produção de efeitos. De referir que a sua
falta determina a ineptidão da petição inicial conforme estipula o artigo art.
193º/2 c) CPC por força do art. 1º CPTA)
Em relação ao pressuposto da conexão
de pedidos a lei diz que o particular pode cumular pedidos que tenham uma única
causa de pedido de acordo com o art 4/1 a) ou que estejam numa relação de prejudicialidade
ou dependência ou ainda estejam em causa a apreciação dos mesmos factos ou a
interpretação e aplicação dos mesmos princípios e regras de direito de acordo
com o art. 4º/1 b).
Em relação ao primeiro requisito,
em primeiro lugar convém referir que causa de pedir consiste nos factos com
base nos quais o autor fundamenta o seu pedido. A
afirmação de um direito que o particular faz em juízo funda-se numa determinada
factualidade. É esta factualidade que se chama causa de pedido, que é o facto
jurídico que fundamenta a pretensão do autor. Portanto, se houver vários
pedidos que nasçam todos da mesma causa, esses podem ser cumulados numa única acção
O segundo requisito, alternativo
ao primeiro, prende-se com a relação dos pedidos entre si, sendo esta um relação
de interdependência, mas no âmbito da mesma Relação jurídica material. Neste
caso falamos de pedidos em que a causa de pedir não é a mesma, todavia, entre
os dois pedidos há uma relação de prejudicialidade ou interdependência. Ou
seja, para um pedido proceder é necessário que o outro tenha procedido, sob
pena de estarmos perante uma cumulação aparente.
Mas a lei permite ainda que haja
cumulação de pedidos, quando a procedência de todos os pedidos cumulados
dependa, essencialmente, dos mesmos factos ou da aplicação das mesmas normas.
Esta norma do art 4/1 b) é justificada pelo princípio da economia processual. A
lei é generosa aqui. Temos vários atos praticados em vários procedimentos, é
possível cumular a impugnação de atos praticados em vários procedimentos? O
legislador diz que sim, pela economia processual. Se a apreciação da validade
dos atos depender dos mesmos factos ou das mesmas normas, ficciona-se que foram
praticados no mesmo procedimento, e portanto, junta-se tudo.
Temos, no nº2 do art.º 4, uma enumeração
exemplificativa, que vai, no fundo, especificar a cláusula geral de
cumulabilidade, que consta do nº1.
A falta de conexão entre os
pedidos constitui uma excepção dilatória nominada (art. 89º/4 j) CPTA)
No entanto existem limites ao
principio da cumulação de pedido, sendo estes de dois tipos:
- · Não é possível cumular quando falte alguma das causas de conexão do art.º 4/1;
- · Quando a competência para conhecer um dos pedidos formulados, pertence a um tribunal alheio à jurisdição administrativa.
Relativamente à forma do
processo, a ação administrativa é a forma processual comum do Contencioso
Administrativo, mas há outras, e algumas dessas formas têm caráter urgente. A
circunstância de, aos pedidos formulados, corresponderem formas diferentes,
nomeadamente, um ser urgente e outro não, impede a cumulação?
O Art. 5º tem uma epígrafe
enganadora. A cumulação é admitida nos
processos urgentes para além dos processos comuns. O problema é que o nº2 e o
nº3 não dizem apenas respeito à cumulação de pedidos em processos urgentes, mas
sim a todos os processos. São de aplicabilidade geral, não só os urgentes.
Temos um processo com tramitação
normal, e temos um processo de tramitação acelerada, como é que conciliamos as
coisas? O art.º 5 vem dizer que é possível cumulação, adotando, para ambos os
pedidos, a forma processual urgente, com as necessárias adaptações. Aqui o
legislador tem uma louvável intenção de acelerar o processo, até onde seja
possível.
Portanto, a diferença na forma
de processo não é incompatível com a cumulação de pedidos, apenas dá lugar a
uma adaptação da forma do processo, ou seja, como dispõe o art. 5.º, n.º 1 do
CPTA, a acção adequada passa a ser a acção especial.
Em relação á competência do tribunal
é exigida ao tribunal competência material para conhecer de todos os pedidos
formulado no art. 5º/3 CPTA), ou seja, a competência para conhecer do mérito da
causa tem de recair sobre o âmbito da jurisdição administrativa. Quando não se
verifique este requisito haverá lugar à absolvição da instância. Assim se o
tribunal competente para um dos pedidos, é judicial, então não pode haver
cumulação, segundo o art.º 5/3
O art. 21º estabelece soluções
para a cumulação de pedidos nos casos em que a apreciação de cada um deles,
caso tivessem sido formulados isoladamente, caberia a tribunais administrativos
diferentes. Aqui pertencem ambos a tribunais administrativos, mas pertencem a tribunais
administrativos diferentes. O regime generoso do nº3 e 4. O nº3 diz que havendo
cumulação sem que entre os pedidos haja a conexão exigida, o juiz notifica o
autor ou autores para que no prazo de 10 dias indiquem o pedido que querem ver
apreciado no processo. Se não disserem nada, absolvição da instância quanto a
todos. A acção nova retroage ao momento da primeira acção. O nº3 e nº4
correspondem ao princípio pro actione, as normas do contencioso devem ser
elaboradas, interpretadas e aplicadas de modo a garantir uma decisão de fundo.
Não houve inicialmente uma decisão de fundo porque houve absolvição da
instância.
Em suma, A flexibilização do
regime da cumulação de pedidos foi um dos importantes pilares da reforma de
2002 a par da introdução do princípio da livre cumulabilidade de
pedidos, que vem permitir não só uma maior flexibilização da conformação do
objecto do processo mas também a possibilidade de o alargamento, a cumulação
passou a estar dependente de requisitos materiais, relativos ao objecto do
processo, e não a regras formais, referentes à identidade de forma.
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