terça-feira, 11 de dezembro de 2018

Presidente da República VS Primeiro-Ministro


No passado mês de novembro, um aluimento de terras levou ao abatimento de um troço de 100 metros da Estrada Nacional 255, entre Vila Viçosa e Borba, no distrito de Évora.

Este abatimento levou ao arrastamento de três viaturas para dentro de uma pedreira, que se localizava por baixo da estrada, causando a morte duas pessoas e quatro desaparecidos.
Quanto ao apuramento de responsabilidades, o Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa e o Primeiro-Ministro António Costa discordam quanto à responsabilidade do Estado no desabamento da Estrada em Borba.
O Primeiro-Ministro considera “que não há evidência da responsabilidade do Estado”, uma vez que a estrada em causa não faz parte da gestão das infraestruturas estatais desde 2005, sendo da competência dos municípios.
Já Marcelo Rebelo de Sousa, ao contrário de António Costa, defende que a “responsabilidade própria da administração pública perante os familiares das vítimas”, com o pagamento de indemnizações, é “evidente”. Esta responsabilidade deriva da responsabilidade objetiva, que é independente do apuramento da responsabilidade subjetiva, ou seja, quais as entidades ou que pessoas poderão ser responsabilizadas por aquilo que aconteceu, em concreto.
Perante esta divergência dentro das nossas forças políticas que poderão fazer os lesados por esta tragédia?
A Lei 67/2007, de 31 de dezembro aprovou o regime da responsabilidade extracontratual do Estado e demais entidades públicas.
De acordo com o artigo 1º, este regime rege a responsabilidade civil extracontratual dos Estados e demais entidades de direito público por danos resultantes do exercício da função administrativa, ou seja, resultantes das ações ou omissões adotadas no exercício de prerrogativas de poder público ou reguladas por disposições de direito administrativo. A menção a prerrogativas de poder público parece apontar para a clássica distinção entre gestão pública e gestão privada. No entanto, de acordo com o Professor Vasco Pereira da Silva, esta referência aos princípios vem unificar o regime da gestão pública e da gestão privada, uma vez que o artigo 2º, n3º do Código do Procedimento Administrativo refere que os princípios gerais da atividade administrativa, que concretizam preceitos constitucionais, são aplicáveis a toda a atividade da Administração Pública.
A responsabilidade objetiva referida pelo Presidente da República parece ser a que resulta do artigo 11º da Lei 67/2007, que estabelece a responsabilidade pelo risco. Segundo o Professor João Caupers, a responsabilidade objetiva não radica em qualquer juízo de reprovação do comportamento do causador do dano. O artigo 11º, n1º refere que, fora do contexto da ilicitude, o Estado e outras entidades públicas sejam responsáveis pelos danos causados por atividades, coisas ou serviços administrativos particularmente perigosos, como o caso da construção de uma estrada sob uma pedreira. Através desta responsabilização objetiva do Estado, os familiares das vítimas poderiam ser indemnizados pelo Estado, mesmo que este não se venha a comprovar o culpado pelos danos causados, ao contrário do que aconteceria quanto à responsabilidade subjetiva (artigo 10º do Regime Jurídico da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado).
Neste confronto entre o Presidente da República e o Primeiro-Ministro, parece ter saído vencedor Marcelo Rebelo de Sousa, que deu assim uma lição de Direito Administrativo ao seu antigo aluno.



Beatriz Lopes da Silva 
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