domingo, 2 de dezembro de 2018

Se a Ana Moura estudasse Contencioso Administrativo


Letra
Que pior forma de arranjar a solução 
P’ra fechar o processo administrativo 
O sujeito foi uma introdução
Mas sem ter relação ou direito reconhecido 

2004 foi o ano que decidiu
O particular defende os seus direitos
Artigo nono foi isso que definiu 
Nem sequer deixou faltar a ação popular


Refrão 
Onde já vai a grande revolução
De aceitar um direito
Qualquer que seja a concepção 
A legitimidade é um pressuposto tal
Que não pode faltar
Ao sujeito processual 


O legislador vem estragar a novidade
Quando escreveu o artigo 55
Como que uma Avó já com alguma idade
Quis deixar a sua ideia com demasiado afinco

Repetitivo um tanto desnecessário
Descreve precisamente essa ideia
Duma posição vantajosa e subjectiva
Que é fundamental para não se ser pessoa alheia 


Refrão 
Onde já vai a grande revolução
De aceitar um direito
Qualquer que seja a concepção 
A legitimidade é um pressuposto tal
Que não pode faltar
Ao sujeito processual 


De acordo com a crítica feita em aula ao disposto no artigo 55, do Código do Procedimento Administrativo, decidi compor uma música que a ilustrasse.
Sendo este um tema muito querido para mim, decidi, para que não houvesse dúvida sobre o seu verdadeiro significado, publicar um texto que o justificasse.
O sujeito, enquanto elemento do processo, é uma questão nova no Contencioso Administrativo, sensivelmente marcado pelo objetivismo, em que o particular era considerado como que um objeto e a Administração tinha um papel equivalente ao do juiz- tinha a mesmo posição da do ato que estava a ser impugnado. O problema, a propósito desta realidade, era que o processo administrativo era demasiado abrangente. Desta forma, procurou-se arranjar critérios que restringissem o processo, e foi assim que nasceu o critério da legitimidade.
Contudo, esta solução, primária, apresenta uma legitimidade desligada de relação material controvertida e de direitos. O particular tem legitimidade quando tem um interesse fáctico. Ou seja, o particular é afetado pela atuação da administração diretamente, podendo, nesses casos, ir a juízo. Mais tarde o interesse fáctico tornou-se num interesse jurídico, correspondendo a direitos subjetivos, ainda que não reconhecidos como verdadeiros direitos.
Só em 2004 é que a ideia de um particular como parte, não mero ajudante do juiz, se tornou real. Foi aqui que se deu uma grande revolução. Retira-se dos artigos 211/3 e 268/4 da CRP e escreve-se no artigo 9 e no artigo 10, a propósito da legitimidade ativa e passiva, a ideia de que existem vários direitos e deveres nas relações materiais entre os particulares e a administração. A relação material controvertida é o objeto do processo e o particular defende os seus direitos. 
Mais concretamente, e para o que nos interesse neste caso, o artigo 9 diz que tem legitimidade processual, isto é, pode ser sujeito processual, quem for parte na relação material controvertida. Por outras palavras, quem for titular de um direito subjectivo. Defendo o professor Vasco Pereira da Silva, que a concepção de direito subjectiva deve ser unitária, englobando todas as posições de vantagem: interesses difusos, interesses legítimos e direitos subjectivos em sentido restrito. O professor, considera assim que o artigo 9/1 do Código do Processo seria suficiente por esta razão. Contudo, a concepção que vigora é a concepção Trinitária, que distingue os interesses legítimos (deveres da Administração Pública, que o professor Vasco na sua concepção entende que a estes deveres correspondem direitos, numa ideia de reciprocidade), interesses difusos (direitos subjectivos de terceira geração relativamente a bens e domínio público, que o professor considera que os particulares podem ser titulares, ainda que não se possam apropriar) e direitos subjetivos em sentido estrito (direitos estabelecidos expressamente pela AP). Uma vez que é esta a concepção que vigora, surge, “contra a vontade” do professor, por falta de necessidade, tendo em conta uma concepção ampla de direito subjectivo, e por contradição a um contenciosos subjectivo, o artigo 9/2 do código. Este artigo vem, assim, falar da ação popular e da ação pública, cobrindo todas as “facetas” de direito subjectivo. Importa referir ainda, que o professor Vasco, entende que o número 2, quando diz “independentemente de interesse pessoal”, quer dizer “quando não tem interesse pessoal”. Isto porque, para que o artigo faça sentido, na linha da concepção Trinitária (em que o particular só tem direito reconhecido quando se trata de um direito subjectivo restrito) e não engula a Ação jurídico-pessoal (que seria inconstitucional face o direito à justiça), as ações popular e pública não se devem confundir com esta primeira, limitando-se a defender a legalidade.

Acontece que esta ideia, acaba por ser estragada pelo legislador. Como uma Avó com medo de não ter desligado o televisão antes de sair de casa, e que volta atrás para se certificar que ficou tudo arrumadinho, o legislador rescreve no artigo 55 (um artigo especial quanto aos pressupostos processuais específicos da ação administrativa especial) exatamente o disposto no artigo 9. O professor Vasco entende que o legislador o faz desnecessariamente e que apenas se quer precaver, por medo de ter deixado algo por dizer. O artigo 55 refere novamente a legitimidade a propósito do particular, incluindo, qualquer que seja a concepção, todas as posições jurídicas de vantagem. Refere a legitimidade do ministério público quanto às ações públicas, e as ações populares. No fundo, foi como se tivesse feito copy parte. 

Terminada esta abordagem, penso que ficará esclarecida a mensagem da música.
Obrigada,
Francisca Pereira da Cruz 140115098

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