A Impugnação Administrativa Necessária
Para compreendermos esta figura é importante referir que, no contencioso clássico, para que um ato
fosse impugnável contenciosamente tinha de ser verticalmente definitivo, ou
seja, tinha de ser proferido pelas instâncias superiores da Administração
Pública. Assim, o particular tinha de proceder a um recurso hierárquico
necessário e só a decisão da instância superior poderia depois ser impugnada
contenciosamente.
Assim sendo, quando em 1989 se alterou a
definição de ato administrativo, retirando os requisitos da definitividade e
executoriedade, desenvolveram-se três teses:
- A primeira tese
defendia que esta eliminação significava a constitucionalização de todas as
normas que impunham o recurso hierárquico necessário;
- A segunda tese defendia
que a eliminação não tem qualquer eficácia na legislação ordinária, o
legislador constitucional não se dedica à matéria dos pressupostos processuais
e por isso a questão era desconstitucionalizada (a posição dominante na
jurisprudência);
- A terceira tese, uma
posição intermédia, defendia que era correta no essencial a segunda posição, de
facto a matéria dos pressupostos não é constitucional, mas é preciso que os
pressupostos processuais e designadamente as exigências de recurso não
representem em vez de um mero condicionamento ao exercício fundamental, uma
restrição ao exercício fundamental (assim obedece a requisitos constitucionais
apertados).
Neste sentido, o Tribunal Constitucional foi
chamado a pronunciar-se e declarou que na medida em que não seja afetado o
exercício à impugnação, não podemos dizer que estes pressupostos sejam
inconstitucionais. Como o particular não é lesado enquanto o superior decide,
porque os efeitos ficam congelados/suspendem-se, não há aqui
inconstitucionalidade. O acórdão do Tribunal Constitucional n.º 499\96 diz
então que a condição para a constitucionalidade é que a interposição do recurso
tenha eficácia suspensiva automática.
O antigo CPA a ideia era
de que o recurso hierárquico necessário precisa de norma habilitante. Já no
novo CPA é afirmado expressamente que o
recurso hierárquico é facultativo, no seu artigo 185.º n.º2. Portanto, a
impugnação administrativa prévia só existe nos casos expressamente previstos na
lei. Para prevenir dúvidas, o artigo 3.º do Decreto-lei n.º 4\2015 (que aprova
a revisão do CPA) dispõe que as impugnações administrativas só são necessárias
quando a lei utilize as seguintes expressões: “impugnação administrativa em
causa é necessária”, “do ato em causa existe sempre reclamação ou recurso”, e
“utilização da impugnação administrativa suspende ou tem efeito suspensivo dos
efeitos do ato impugnado”. Nos restantes casos a impugnação administrativa
prévia tem-se como tacitamente revogada.
Por fim, para que seja
imposto o recurso hierárquico necessário é preciso então três requisitos: o
prazo mínimo de dez dias; a eficácia suspensiva do ato; e a consagração clara
deste pressuposto processual (nomeadamente utilizando as expressões já
elencadas). Atenção que, se o particular impugnar administrativamente por ter
sido induzido em erro, exige-se a admissão da impugnação contenciosa fora de
prazo, de acordo com o 58.º n.º4 do CPTA. Além do já referido, de acordo com os
artigos 189.º e 190.º do CPA assim como o artigo 3.º n.º3 do Decreto-Lei
n.º4\2015 as impugnações administrativas necessárias suspendem sempre os
efeitos do ato impugnado. Portanto, o prazo para a reclamação é de 15 dias
(191.º n.º3 do CPA) e para recurso hierárquico necessário 30 dias (193.º n.º2).
O artigo 3.º n.º3 do Decreto-Lei dispõe que o prazo mínimo para a utilização de
impugnações administrativas necessárias é de 10 dias, quando o previsto na lei
seja inferior (onde está escrito 5 dias, passa a ler-se 10). O prazo para a
decisão dos recursos e reclamações é de 30 dias, de acordo com os artigos 192.º
n.º2 e 198.º n.º1 do CPA. Atenção que, de acordo com o artigo 198.º n.º4, o ato
sujeito a impugnação contenciosa é o do subalterno e não o do superior. Ou seja,
embora haja quem defenda que a impugnação administrativa necessária será um
desdobramento da impugnabilidade, à quem adote a posição de que estamos perante
um pressuposto processual autónomo, mas não necessário.
Lourenço Paour
140115172
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