quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

Embargo da obra nova -- O futuro das residências para idosos na Foz Velha


Embargo da obra de residências para idosos na Foz Velha


O projeto para a estrutura residencial para pessoas idosas, prevista para a zona da Foz Velha tem sofrido entraves. O local previsto para esta edificação foi considerado como conjunto de interesse publico desde 2013.
As obras chegaram a começam tendo começado escavações e abate de árvores mas desde logo que a Direção Regional de Cultura do Norte solicitou à Câmara do Porto a imediata suspensão das obras por inexistência de parecer obrigatório.

Para além disso, a Associação dos Moradores e Amigos da Foz Velha pediu à Câmara do Porto uma fiscalização das obras alegando a falta de licença e de parecer da DRCN.
Esta associação apresentou também uma petição junto da Assembleia da República para proteção e defesa do património que considera estar em perigo com a edificação.
Para além disso “interpôs uma ação no Tribunal Administrativo e Fiscal contra a Câmara do Porto e o Ministério da Cultura por considerar existirem ilegalidades na aprovação e licenciamento do loteamento”.
           

A Direção-Regional de Cultura do Norte solicitou à Câmara do Porto a imediata suspensão. O presidente da Câmara do Porto pronunciou-se referindo que não iria mandar para a obra e sugerindo que quem o deveria fazer seria a Direção da Cultura. Num jogo em que estão em causa interesses económicos, sociais e políticos passa-se a batata quente para o próximo na esperança que não volte para trás.

Nesta fase do processo estamos perante um projeto para uma zona da cidade que é considerada protegida e sobre o qual existem dúvidas se o projeto deve avançar ou não por não se ter a certeza da existência de todos os pareceres necessários e por alegadamente existir uma perda de património de interesse público. Havendo a dúvida, se o projeto não for parado corremos o risco de os danos serem totalmente irreversíveis ! É certo que também temos de considerar o lado da construtora, ou seja, parar esta obra significa custos para a construtora que podem até ser muito significativos. Mas estes danos para a construtora podem ser reparáveis enquanto que os danos para o património protegido (tanto edifícios como as árvores) são muito dificilmente reparáveis ou até mesmo irreparáveis.

Chegando a este ponto parece ser o mais sensato mandar parar a obra. Mas será que existe algum mecanismo no direito administrativo que permita parar uma obra imediatamente? Existe um processo principal nos Tribunais Administrativos e Fiscais interposto pela Associação de Moradores e Amigos da Foz Velha, mas este processo vai demorar a ser decidido e se esperar-mos até ao fim do processo pode ser tarde demais porque a obra prosseguiu. É necessário um mecanismo urgente e com eficácia imediata para que a obra seja parada, esse mecanismo é uma providencia cautelar. Neste caso concreto uma providencia cautelar de embargo de obra nova, previsto no artigo 112º nº2 g). Esta providencia não existia antes da reforma do código onde se estabeleceu uma cláusula aberta no artigo 112º nº1 e no nº2 se estabelece uma lista a titulo exemplificativo. Um desses exemplos é o embargo de obra nova que foi introduzida para poder fazer cessar lesões ambientais ou de um bem jurídico de natureza real (neste caso as árvores e as edificações). Este mecanismo está também previsto no artigo 86º nº2 a) da Lei nº 31/2014, de 30 de Maio.

A providencia cautelar foi interposta pela associação de moradores e o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto determinou a suspensão dos trabalhos.
Será que podia a associação interpor esta providencia? O artigo 112º nº1 refere que tem legitimidade para tal quem possua legitimidade para intentar um processo junto dos tribunais administrativos, podendo intentar providências cautelares antecipatórias ou provisórias. Esta Associação tem legitimidade pelo artigo 9º nº2 tanto para intentar ações principais como cautelares pois estamos perante uma associação que está a defender interesses em causa, está a defender valores e bens constitucionalmente protegidos como o ambiente, urbanismo, património cultural e eventualmente até ordenamento do território. Neste caso sendo o embargo de obra pública trata-se de um providencia cautelar conservatória porque conserva a situação atual até à sentença definitiva.

A providencia cautelar é acessória ao processo principal (artigo 113º) mas não tem de ser proposta ao mesmo tempo que este. O momento para a interposição de uma providencia cautelar pode ser 1 de 3, estando eles previstos no artigo 114º :  
a) O requerimento da providência cautelar pode ser prévio ao pedido principal
b) Pode ser apresentada a petição inicial para o processo cautelar e para o processo principal
c)  Estando a correr um processo principal pode ser interposta a qualquer momento o pedido de providência cautelar
Neste caso o processo cautelar surge na pendência da ação principal que a associação interpôs naquele tribunal contra o Ministério da Cultura e a Câmara do Porto.  


Temos de verificar se estão reunidos os requisitos para se adotar uma medida cautelar e para isso recorremos ao artigo 120º que refere que é preciso haver um “fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal”.  

A associação considera que a construção criará um grave dano que seja dificilmente reparável ou mesmo irreparável. É necessário nestes casos haver uma ponderação entre os interesses públicos e privados e dos danos que resultam. 
Se os danos da concessão forem superiores aos que podem advir da recusa, a adoção da providencia é recusada, ou seja, o juiz toma a decisão tendo em conta uma contraposição de interesses e as regras da proporcionalidade (120º nº2). Este nº2 serve como uma “clausula de salvaguarda” nas palavras do professor Mário Aroso de Almeida. 

Neste caso o juiz decretou o embargo da obra para “defender o interesse público face ao interesse do seu promotor”. Alega ainda que “o direito de propriedade, incluindo o direito de construir, tal como a generalidade dos direitos patrimoniais constitucionalmente garantidos, não é um direito absoluto e ilimitado, tendo de ser compatibilizado com o interesse geral” e que “ as obras previstas implicam o risco de destruição e deterioração de um conjunto classificado”. O juiz relembrou que os prejuízos que a Câmara do Porto e a empresa contra-interessada podem sofrer com a paragem dos trabalhos podem ser reparados ao contrário do património que seria destruído, tal como já tinha referido acima.

O embargo provisório aconteceu a 13 de Abril e mais tarde o embargo total.
O promotor interpôs recurso da decisão de embargo alegando que o embargo total da obra é exagerado e que no máximo devia ter sido decretada uma providencia que “preservasse o risco de produção da situação de facto consumado identificada, devendo a mesma consistir não num embargo total mas numa proibição de execução de obras de demolição. Esta providencia cautelar não se limita ao estritamente necessário para evitar a lesão dos interesses defendidos”. As providências devem limitar-se ao necessário para evitar a lesão dos interesses defendidos (120º nº3). Alega que os danos que resultam do embargo total são superiores ao que resultam da sua recusa. O juiz dispõe de uma clausula aberta em matéria de providencias cautelares (112º nº1) podendo construir uma providencia que considere ser a mais adequada.

O Tribunal Central Administrativo do Norte negou o recurso dos promotores da construção alegando que existe fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado e que os danos seriam irreversíveis e que não são suscetíveis de quantificação monetária.

Este é mais um caso em que foi usada uma providência cautelar no Contenciso Administrativo, em especial uma providência que foi acolhida recentemente. Neste momento aguarda-se decisão da ação principal para saber se a obra prossegue ou não. 



 Catarina Melo
140114064

Bibliografia:
Aulas teórico-práticas

Henrique Soares Ramos, Jorge : Processos Cautelares no (novo) Contencioso Administrativo”
https://www.trc.pt/index.php/doutrina/445-processos-cautelares-no-novo-contencioso-administrativo


Sem comentários:

Enviar um comentário