Queres jantar?
São cinco
horas da tarde e João continua, nervoso, à espera da resposta à mensagem (já
vista no Whatsapp) que enviou a Maria, nessa manhã. São sete horas da tarde e a
resposta ainda não chegou…. Queres jantar?
Uma pergunta tão simples, que exige uma resposta tão simples, mas Maria tarda
em responder. Às nove da noite, ainda sem resposta, João percebe que Maria não
quer jantar. João acaba por jantar sozinho no snack-bar mesmo por baixo de sua
casa. Armindo, velho empregado do estabelecimento, que estava por dentro da
longa paixão de João, pergunta: "Então, rejeitou o convite?" Ao que João
desanimado, responde: "Foi mais ou menos isso…"
No Direito
Administrativo português vemos previsto no artigo 13º/1 CPA o Princípio da
decisão ou o dever de decidir da Administração Pública, que enuncia uma
obrigação da Administração de decidir sobre todos os assuntos que sejam
apresentados aos seus órgãos e sobre petições, representações, reclamações ou
queixas que tenham como base legislação e interesse público. A Administração
encontra-se vinculada a cumprir este dever e seja qual for a decisão tem
obrigatoriamente de se pronunciar nesse âmbito.
Mesmo quando o órgão alvo do pedido não seja
competente na matéria este dever mantém-se, já que se aplica o artigo 41º/1 CPA
e o documento tem de ser enviado para órgão competente, que, por sua vez,
tratará de formular uma decisão.
Encontramos, porém, uma exceção ao dever de
decidir no 13º/2 CPA, já que esse dever é inexistente se há menos de dois anos
(deste novo pedido) a Administração já “(…)tenha praticado um ato
administrativo sobre o mesmo pedido, formulado pelo mesmo particular com os
mesmos fundamentos.”.
Visto isto,
quais são efetivamente os prazos que a administração tem que seguir em sede de
decisão? O prazo-regra é de 90 dias para emitir decisão e está enunciado no
artigo 128º/1 CPA, pode ser alargado por circunstâncias excecionais, em caso de
prorrogação ou necessidade de formalidades especiais (128º/1 e 2 CPA).
Para
procedimentos de iniciativa oficiosa que possam significar uma decisão com
efeitos desfavoráveis para os interessados encontra-se previsto no 128º/6 CPA
que os mesmos caducam findo um prazo de 180 dias.
A contagem
dos prazos vistos supra faz-se seguindo os termos do artigo 87º CPA.
Juntando estes dois elementos primeiramente
tratados (existência de um dever de decisão e prazos a serem respeitados)
conferimos que se dá Inércia da Administração quando passe o prazo e esta se
mantenha em silêncio, passando a haver uma Omissão Legal. Este incumprimento do
dever de decisão encontra-se plasmado no artigo 129º CPA e neste mesmo artigo
estão enunciadas as possíveis “consequências” para este incumprimento:
Recurso aos
meios de tutela jurisdicional por parte do interessado;
Recurso aos
meios de tutela administrativa por parte do interessado – Tal como previsto no
artigo 184º/1;b) CPA (em sede de reclamação), nos artigos 193º/2 e 197º/4 CPA
(em sede de recurso hierárquico) e nos artigos º/1; a) e 37.º/1; b) do CPTA;
Deferimento
Tácito – Valor positivo do silêncio (130º/1 CPA);
Debruçar-me-ei mais sobre esta última figura.
Os atos
tácitos permitem ao interessado que exerça a sua posição jurídica sem
necessidade de pronúncia da Administração Pública, tratando-se, na gíria, de um
“quem cala, consente”.
Regulada no artigo 130º do CPA, hoje inclui
somente atos tácitos de conteúdo positivo, já que o
indeferimento tácito já não existe desde a entrada em vigor do CPTA em 2004,
devido à reforma do contencioso administrativo.
Isto aplica-se
a todas as vezes que a Administração eventualmente não se pronuncie?
A resposta é negativa, já que de acordo com o
artigo 130º CPA existe deferimento tácito por silêncio da Administração só se
existir legislação/regulamentação que confira ao silêncio esse valor. Não
havendo lei ou regulamento que determine a ausência de notificação da decisão
final como deferimento tácito há realmente um incumprimento por parte da
Administração, relativamente ao qual os particulares têm as hipóteses de tutela
vistas já supra.
Havendo
deferimento tácito faz sentido o interessado recorrer aos meios de tutela
Administrativa ou Judicial? Há divergência doutrinária neste sentido.
Sérvulo Correia seguindo a esteira de João
Tiago Silveira refere que (…) “havendo deferimento tácito, o ato já existe: os
seus efeitos típicos encontram-se desde logo constituídos na esfera do
interessado. Uma ação de condenação à pratica de ato administrativo com o mesmo
conteúdo enfermaria de possibilidade do objeto.” E que de qualquer das maneiras
(…) “o deferimento tácito fornece, tendencialmente, uma solução mais completa e
rápida para o problema do particular”.
Por outro
lado, Vasco Pereira da Silva contesta que o deferimento tácito dê origem a um
ato administrativo e Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado Matos defendem que
o interessado pode na mesma (…) “pedir a condenação da Administração à emissão
do ato administrativo ilegalmente omitido, de modo a obter uma tutela plena da
sua situação jurídica.”
Há que
distinguir igualmente o Ato Tácito da Comunicação Prévia com prazo, prevista no
artigo 134º/3 CPA, que acaba por ser uma alternativa à atribuição de um valor
positivo ao silêncio da Administração.
No ato tácito o particular recebe uma
habilitação administrativa propriamente dita enquanto na comunicação prévia não
se atua ao abrigo de um ato administrativo, sendo uma mera comunicação de que
se vai agir num certo âmbito (isto é relevante devido a uma eventual
responsabilização por danos, onde no caso da comunicação prévia o responsável será
sempre unicamente o particular.
Não obstante tudo isto voltamos a verificar
que é sempre necessária previsão específica para dar o valor positivo ao
silêncio. Faz, porém, todo o sentido que assim seja, já que se pretende evitar
que o silêncio da administração ganhe valor positivo num espectro maior e que a
Administração corra o risco de deferir tacitamente (por inércia, negligência,
entre diversos outros motivos) pedidos absurdos, desproporcionais ou contra o
interesse público.
Teresa Sande Lemos
140115030
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