O
modelo de justiça administrativa era o liberal, sendo que no quadro da
lógica da constituição de 1933, os tribunais não eram tribunais judiciais, pois estavam sob a administração do conselho de ministros. Assim, até 1977, não
existia execução das sentenças. Marcello Caetano considerava este um momento
gracioso da Administração Pública porque, em rigor, a última palavra era sua.
Já Freitas do Amaral afirma que a justiça privada
se manteve em Portugal no quadro da constituição de 1933. É sim a constituição
de 1976 que vai promover o batismo do poder judicial.
As dúvidas assaltavam o legislador quanto ao
modelo a adotar, equacionando a constituição de 1911, em que os tribunais
comuns julgavam a Administração Pública, de forma semelhante ao modelo
britânico. Acabou por deixar a norma aberta, dando espaço de decisão ao poder
legislativo conjetural.
A
constituição tinha elementos que enunciavam um compromisso: por um lado, a
lógica da limitação do contencioso administrativo; por outro, a ideia de que os
tribunais existiam para tutelar os direitos dos particulares.
Comprometeram-se
então o velho e o novo, a fase do batismo e a da confirmação, o que de alguma
maneira é sintomático da lógica da constituição de 1976.
Era
uma constituição, talvez também por isso, contraditória porque defendia uma
sociedade sem classes, um direito de propriedade privada e de livre exercício
de uma atividade económica; as nacionalizações e a existência de um sector
privado. Defendia ainda a democracia mas mantinha um órgão revolucionário, que
era o conselho da revolução.
Na
perspetiva de Jorge Miranda havia um compromisso entre realidades antagónicas,
que acaba por dar origem a uma realidade constitucional que não era o que
estava no texto e a obriga a desenvolver-se num determinado sentido.
Estes
fenómenos de evolução e desenvolvimento constitucional são, na ótica de alguma
doutrina, passados dentro de uma intrínseca rutura, ainda que limitada,
enunciada nas alterações materiais, sendo que cada uma das revisões
constitucionais foi rompendo com a ideia do compromisso original.
Este
processo também ocorre no que respeita ao Código Administrativo porque a Constituição
vai consagrar um compromisso entre o batismo, o contencioso do poder, da anulação
de atos administrativos (limitado naquilo que corresponderia ao âmbito do CA) numa
dicotomia com o período de consagração de um direito fundamental de acesso ao
CA, introduzindo uma dimensão subjetiva no mesmo. Ocorre também uma integração dos
tribunais administrativos no seio jurisdicional. Subscreve-se assim uma
construção compromissória, entre o velho CA que constava da CRP e o novo CA que
se queria edificar. O próprio direito fundamental que a CRP garantia era o de recurso contencioso,
que se caracterizava na possibilidade de ir a tribunal pedir a anulação de atos
que punham em causa certos direitos (de atos definitivos da AP). O recurso era,
por si só, um meio processual em que o juiz apenas podia anular decisões
administrativas, que se renova na jurisdicionalização dos tribunais. Não se
deixou de receber o velho contencioso administrativo em aspetos essenciais do
modelo constitucional, em que o direito fundamental de acesso aos tribunais era
igualmente um direito fundamental ao recurso da administração, materializando
uma tutela privada. A CRP de 1976 não deixou de adotar uma visão autoritária do
ato administrativo.
Mas,
se relevava o velho, também importava o novo, sendo criadas entidades integradas
no poder judicial. O facto de se falar num direito fundamental ao recurso,
reconhecendo uma dimensão subjetiva ao contencioso, era também uma manifestação
da novidade. Surgiram com isto também novos direitos dos particulares, como o direito
de fundamentação das decisões, por exemplo, e consagra-se finalmente o ato
definitivo executório.
Consagra-se
assim o direito administrativo autoritário e o novo direito administrativo, sendo
este compromisso alterado em 1982, 1989 e 1997.
Inês Nunes
140114090
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