quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

Os dilemas do nº3 do Artigo 95º


No artigo 95º do CPTA, o legislador regula o objecto e limites das decisões, afastastando outros limites que existiam tradicionalmente para os tribunais administrativos, de acordo com a nova realidade do Contencioso Administrativo.

No nº1, no que toca à valorização do objecto do processo, o legislador estabelece o princípio pelo qual o juíz conhece tudo aquilo que o particular alega, mas apenas o que o particular alega. Porém, não basta apreciar a forma, é preciso pronúncia sobre o mérito – art 7º. O juíz deve verificar todas as ilegalidades que possam existir, sob pena da inutilidade do processo. O pedido e a causa de pedir têm de ser apreciados em simultâneo: é necessário um mínimo inquisitório por vezes, como se pode ver no “salvo quando a lei lhe permita ou imponha o conhecimento oficioso...”.

O nº3 levanta uma discussão entre o Professor Vasco Pereira da Silva e o Professor Mário Aroso de Almeida, quanto a saber se este é ou não uma excepção ao nº1.

O Professor Mário Aroso de Almeida afirma que o nº 3 constitui uma excepção inquisitória à realidade acusatória, e, além disso, que o juíz pode carrear factos novos para o processo. O Professor defende as suas afirmações, apoiando-se na teoria do direito reactivo. Segundo esta teoria, o particular é titular de um direito reactivo, de ir a juízo, de forma a afastar a ilegalidade do acto administrativo. Este direito só nasce quando é violado, exercendo, a partir daí, o particular a sua pretensão de afastar a ilegalidade. Para esse efeito, o juíz deve conhecer também o que o particular não alega, de forma a conhecer os factos que levaram à ilegalidade.

O Professor Vasco Pereira da Silva discorda de ambas as afirmações, pois o juíz não pode trazer factos novos para o processo, sendo este imparcial e não uma parte, podendo apenas intervir dentro dos limites constitucionais: pode corrigir as qualificações jurídicas alegadas pelas partes, e não está obrigado a analisar a causa em função dos vícios alegados pelas partes, se estas os identificarem, podendo construir o processo correctamente. O facto do juíz conhecer da integralidade do objecto do processo não faz deste parte no processo. Esta interpretação que o Professor Mário Aroso de Almeida é inconstitucional, o juíz tem sempre de partir do que é alegado pelas partes, sendo esse um limite imposto ao juíz.
Quanto à teoria do direito reactivo, considera que esta teoria é inadmissível pois faz confusão entre o direito de ir a tribunal/reagir, e os outros direitos substantivos que foram violados, que são a razão pela qual o particular vai a tribunal. Confunde a relação jurídica processual com a relação jurídica substantiva, ou seja, confunde o processo com a realidade substantiva, reduzindo tudo a direitos processuais.
Para o Professor Vasco Pereira da Silva, o nº3 não é uma excepção ao nº1 do artigo 95º, mas sim uma manifestação do princípio do contraditório. Na primeira parte deste nº, repete-se o já estipulado no nº1. Na segunda parte, estipula o legislador que o juíz pode identificar a existência de causas de invalidade diversas das alegadas, o que significa que, não só não está o juíz preso à qualificação jurídica das partes, o que permite um alargamento do objecto do processo, mas também que o juíz deve apreciar a invalidade no seu todo.

Sobre este debate, a jurisprudência defende que o juíz pode, de facto, reconstruir o objecto do processo mas com o limite de se manter dentro dos factos invocados pelas partes.


Inês Nunes
140114090




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